sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

A Convidada do Casamento, Carson McCullers


[Leitura Compartilhada com O PintassilgoPipa não Sabe Voar, Alma do Meu Sonho, In a Handful of Dust, De Coisas por AíAmanda Jordão e quem mais se interesse]

Título: A Convidada do Casamento
Titulo Original: The Member of the Wedding
Escritora: Carson McCullers (Estados Unidos)
Ano de publicação: 1946
Editora: Penguin Classics
Páginas: 240

A Convidada do Casamento não é uma leitura fácil. Imagino que algumas pessoas discordem dessa afirmação, mas para mim todo e qualquer livro que tenha poucos acontecimentos em sua trama e muito trabalho psicológico de personagens é um livro difícil. A protagonista, Frankie, é uma menina de doze anos que está vivendo um dos verões mais tediosos de sua existência; e Carson McCullers não facilita a vida de seu leitor, já que todo o tédio que Frankie experimenta nós também experimentamos. Há calor e abafamento, já que a história tem lugar no sul dos Estados Unidos, há moscas, há jogos de baralho intermináveis, há jantares lentos e há conversas repetidas. A sensação que temos é a de que a vida de Frankie parece não sair do lugar.

Frankie não se sente parte de nada. Ela não tem amigos, sua mãe faleceu quando ela nasceu e seu pai é um figura ausente. Ela passa todo o verão na cozinha de sua casa, na companhia de Berenice, uma empregada doméstica negra, e John Henry, seu primo de seis anos de idade. Frankie está passando por aquela fase da adolescência de intenso questionamento. Apesar de usar o cabelo bem curto, em um corte joãozinho que a faz parecer um menino, ela demonstra constante preocupação com a sua alta estatura e com sua aparência física. Quando perguntada sobre como seria um mundo perfeito, Frankie responde que seria um em que as pessoas pudessem livremente mudar do sexo masculino para o feminino e vice-versa, desde que assim o desejassem. Esse mundo livre de gêneros que Frankie imagina demonstra sua dificuldade em lidar com sua feminilidade, e ao mesmo tempo em que ela assume a aparência de um menino, coloca um batom rosa-choque quando deseja parecer mais bonita e desejável, experimentando aquele confuso sentimento adolescente de quem ainda não se sente confortável com sua sexualidade em desenvolvimento

A todo tempo Frankie questiona qual o seu lugar no mundo, já que ela não se sente conectada com as pessoas ao seu redor. Ela está sempre sentindo uma mistura de solidão, medo, tédio e angústia: 
She was afraid of these things that made her suddendly wonder who she was, and what she was going to be in the world, and why she was standing at that minute, seeing a light, or listening, or staring up into the sky: alone. She was afraid, and there was a queer tightness in her chest.
A ideia central do livro é a de Frankie, ao ser convidada para o casamento de seu irmão, apaixona-se pelo casamento em si, o que cria nela um intenso desejo de juntar-se a esse casal e viajar com ele pelo mundo. O título original do livro, em inglês, "The Member of the Wedding", que em tradução livre seria "O Membro do Casamento", retrata justamente esse sentimento de Frankie de que ela é parte deste casamento, de que por ser um futuro membro desse casamento ela finalmente se sente conectada com o mundo. A paixão de Frankie pelo casamento, apesar de bizarra e fadada ao fracasso, é compreensível para o leitor, já que o irmão e sua noiva estão constantemente viajando, sempre se mostram interessantes, são bonitos e jovens e representam a mudança que Frankie tanto deseja em sua vida.  

A narrativa de Carson McCullers é focada em sentimentos, pensamentos e sensações, e não em eventos, o que torna o ritmo do livro lento e por vezes até mesmo arrastado, ainda que repleto de momentos poéticos. Em um das cenas do livro, por exemplo, um afinador de pianos toca as notas musicais numa escala ascendente, mas sempre pára antes de chegar ao fim, repetindo constantemente as notas, numa clara metáfora da vida de Frankie que parece nunca chegar a lugar nenhum. 

Outro aspecto interessante do livro é sua divisão em três partes e o fato de a protagonista receber três diferentes nomes, um para cada parte. Na primeira parte ela é Frankie e apelido enfatiza o aspecto infantil da personagem, bem como sua dificuldade em lidar com sua feminilidade, já que Frankie é um nome que serve para ambos os sexos. Na segunda parte ela é F. Jasmine, o que demonstra o esforço da protagonista para projetar uma imagem adulta, o que exige o abandono do apelido da infância. Na terceira e última parte ela é simplesmente Frances, o que representa o amadurecimento da personagem e a aceitação de sua identidade. 

Em muitos aspectos, a temática de A Convidada do Casamento lembra o já clássico livro O Apanhador no Campo de Centeio, mas Frankie, apesar de ser uma personagem muito bem desenvolvida e complexa, não possui a personalidade cativante e carismática de Holden Caulfield, o que torna o mundo visto pelos olhos de Frankie apático, tedioso, desinteressante e por vezes até mesmo sombrio. Frankie é extremamente insegura, não é nem um pouco engraçada e muitas de suas ideias beiram o ridículo, o que torna difícil para o leitor desenvolver um sentimento de empatia. Mas nada disso é um acaso, já que a intenção de Carson McCullers é mostrar que mesmo essa adolescente desajeitada, desajustada e solitária com quem não nos importamos tanto assim precisa sentir-se amada, desejada e querida, assim como toda e qualquer pessoa no mundo.  

Vídeo do YouTube em que comento a leitura do livro:

7 comentários:

  1. Eduarda, apesar de você não ter gostado tanto assim do livro (aparentemente), eu fiquei muito interessada por tudo que você descreveu e já estou lamentando por saber que não vou poder acompanhar vocês nessa leitura. Adorei a resenha! =D

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    1. Lua, você ficou com a impressão de que eu não gostei, foi? Não... Eu gostei sim, mas para mim a leitura foi bem lenta. Geralmente quando eu gosto muito de um livro, leio bem rápido, mas esse tem um ritmo diferente mesmo e estranhei isso. Mas é um excelente livro! Carson McCullers escreve muito bem.
      Você pode ler depois, Lua! Sem pressa!
      Beijo!

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  2. Definitivamente deu preguica de ler o livro só de ver a descricao. huahuahauhauhauhau!!! Mas só tem livro de festa aqui, é? Lua de mel, casamento, a tal da festa da babette...

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    1. Hahahahahaha. As festas estão passando longe, viu? "A Festa de Babette" está mais para um banquete/jantar, "A Lua de Mel" nem tem festa de casamento e em "A Convidada do Casamento" Carson McCullers pula a descrição da festa. Ou seja, nada de festas... =P

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  3. Poxa, queria tanto encontrar a versão digital desse livro! Você teria alguma referência?
    Até no site da livraria cultura, que geralmente tem livros bacanas, eu nao achei esse. A não ser em inglês, mas daí já complica pra mim, rsss.... Será que você pode me ajudar?

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    1. Infelizmente não posso te ajudar, Ana. Li a versão digital em inglês justamente porque não encontrei outra, em português. A leitura ficou mais fácil depois que instalei um dicionário no Kindle.
      E o livro físico? Você não quer de jeito nenhum? Acho que ele seria mais fácil de encontrar.
      Se quiser posso te passar A Balada do Café Triste, também da Carson McCullers, numa versão digital em português. Caso te interesse, me manda um e-mail: maquiadanalivraria@gmail.com
      Beijo!

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    2. Versão digital? e o toque do papel? e o cheiro dos livros? e o gosto de passar as folhas? e o gosto do que é efectivamente um livro? um livro!

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